terça-feira, junho 07, 2005
Perseguição Ocular
Hoje vi-me, com inesperado distanciamento, a atravessar a estação de metro. Vi-me literalmente. Como se me tivesse elevado a uma câmara de vigilância estrategicamente posicionada, centrada só em mim, com um zoom tal que me trespassava.
Tinha um andar incerto mas coerente, acompanhado pelo correcto balançar de braços: não muito intenso arriscando ser artificial ou disjunto do resto do corpo, nem restringido podendo revelar uma desconfortável existência. O olhar alternava entre o chão e as várias mulheres com que me cruzava, procurando reciprocidade e audaz repetição – com o chão claro. A música, à semelhança dos livros, sempre foi a forma ideal de evasão parcial. Preciso apenas de saber quando iniciam as escadas rolantes e onde termina a plataforma para os passageiros.
O sinal sonoro anuncia a chegada das carruagens e leva-nos a todos a amontoarmo-nos como um rebanho sedento de protecção humana. Tento evitar todos os braços estranhos e acabo por afastar-me demasiado. Perco oportunidade de entrar, como uma migalha desafortunada. Estou atrasado e fico deprimido, parcialmente desfocado.
De novo o sinal sonoro. Demasiado cedo e, portanto, inesperado. Estou feliz. Olho para o placar preto de luzes laranjas que revela a identidade da próxima composição maquinal: reservado.
Demoro algum tempo a focar o corpo e o resto, o resto dele.
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música: Envy - Color of Fetters
pensamento: risco de aproximação
Æmitis :: 22:10 :::
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